sexta-feira, 26 de julho de 2013

Tudo dando certo...

Gente, sei que não escrevo há horas. Desculpem. Andei exausta, cansada, alguns dias triste, mas a maioria de saco cheio mesmo... Ir e voltar do hospital no trânsito do Rio, com o Erik atrás, às vezes vomitando, foi realmente exaustivo. Ah, eu sei que não deveria reclamar: tantos e tantos cariocas enfrentam esse trânsito horroroso todos os dias para ir trabalhar... mas eu vivo uma sensação permanente de desacerto - de não estar no lugar certo na hora certa, de estar sempre em dívida com algum setor da vida... Nestes dois últimos dias, 5a. e 6a, foi feriado no Rio e as coisas foram um pouco melhores, em função da JMJ. Mas na 3a. feira, levei 4 horas para ir, e outras 2h para voltar. Depois fui ao supermercado, à noite, o que significou mais 2h de carro. Ao todo foram 8h dirigindo num único dia. Dava para ir à SP e voltar, não é absurdo?! Papa Francisco, bem vindo ao Rio de Janeiro, Cidade Maravilha da Beleza e do Caos.

Hoje, 6a. feira, terminamos o Ara-C, última dose. Estamos assim em vias de concluir a fase da indução. Na 2a. feira falta uma dose de MTX, e na próxima 6a. feira, 02/08, fazemos no Centro Cirúrgico (mais uma anestesia geral) a última Químioterapia Intratecal, profilática do Sistema Nervoso Central, e o Mielograma, o que encerra essa fase. O Mielograma nos dirá se ela foi concluida com o sucesso esperado, ou seja, se o Erik está mesmo em remissão, sem sinais da doença. Isso vai classificá-lo em definitivo no grupo de risco e definirá a fase seguinte de tratamento. Terei uma consulta já pré-marcada para o dia 09/08, com o Dr. Alexandre.

Dia 01/08, 5a. feira, o Erik fará o raio-X para verificar a situação da sua perna, mas somente dia 07/08 ele terá consulta com o ortopedista para ver se está ou não liberado para andar. Neste exato instante ele tentou levantar. Está louco para sair andando, correndo. Cheio de energia. Anda difícil contê-lo.

Fiz boas amigas na ala de quimioterapia ambulatorial. Enfermeiras guerreiras, com sua generosidade infinita... Kátia, obrigada pelas conversas. Teus mais de 20 anos de prática são muito mais do que prática, mas uma missão bem cumprida. Tens razão, não há de ser por acaso que escolhestes esssa profissão, que caístes aí, numa ala pediátrica do INCA, e que abraças teu filho todas as noites quando voltas para casa, e que choras escondido. Parabéns, amiga, mereces um lugarzinho no céu, tenho certeza. E há quem não acredite em anjos... tsk, tsk.

Tem também os médicos que não resistem e começam a se aproximar, a se envolver - Dra. Luciana Brito, obrigada pelo seu carinho, dedicação e interesse. Férias mais que merecidas, sentirei sua falta neste próximo mês! Imaginem como deve ser difícil para um médico se envolver... tantos pacientes, tantas histórias, a sobrevida aos fracassos inevitáveis, tudo empurra para o afastamento, o isolamento, o distanciamento... Mas... ser médico, no sentido mais amplo da palavra, ao meu ver, é muito mais do que ser apenas um excelente cientista. É preciso humanidade, olho no olho, interesse pelo paciente, pela sua condição global, pela sua saúde integral. É preciso entrega. Disponibilidade. É preciso estar disposto a desarmar-se, a permitir-se emoção. E como manter a emoção e a razão trabalhando juntas numa sala de cirurgia, durante um atendimento de emergência?!

E outras tantas mães e filhos vivendo a mesma guerra que a minha, em fases diferentes, contra inimigos às vezes piores, às vezes melhores... todas elas com os corações nas mãos, vivendo seus "Sim" de Marias, suas próprias missões.

Histórias terríveis que ouço: uma avó - que não deve ser mais velha do que eu - cuja filha abandonou os filhos com ela, inclusive um menino de 2 anos doente - e que está em vias de abandonar o tratamento do neto, pois não tem com quem deixar os outros três, inclusive uma menininha de seis meses... Já viram o filme "Escolha de Sofia"? Horrível, né? Um dos filmes mais tocantes que já assisti. Tenho visto vários destes nos corredores do hospital, ao vivo e a cores. Uma mãe que fala ao telefone com o filho de 8 anos, pedindo pelo amor de Deus que não mexa no fogão, que ela deixou a comida pronta em cima da mesa, que ele e os outros 2 filhos menores devem esperar por ela dentro de casa, enquanto a quimioterapia da mais velha não termina... Tantas, mas tantas mulheres grávidas, tratando de filhos doentes... e aquela para quem a miséria é tanta que precisamos desinfetar a cadeira quando ela sai, pois deve ser moradora de rua, tal o estado dos seus pés, cascas pretas cheias de calos, e o cheiro que deixa à sua volta... O câncer é uma doença terrível, que não escolhe ricos, pobres, remediados... mas tenho estado sensível demais às situações que PODERIAM SER EVITADAS, TRATADAS, ATENDIDAS, já que, com as inevitáveis, precisamos nos conformar! E não é de caridade que essas mães precisam, é de políticas públicas, de habitação, de saneamento, sobretudo de educação. É de planejamento familiar acessível, disponível, por favor! Como podem negar, no serviço público, a uma mãe de 3 filhos, que faça a ligadura das trompas, ainda que ela tenha apenas 25 anos? Sendo isso assim tão impossível, pelo seu caráter definitivo, porque não já colocar um DIU que dure 5 anos?! Deveria ser de graça, deveria ser OFERECIDO, explicado, sugerido! Elas não querem mais filhos, mas não sabem evitar. Não sabem, de verdade. Esse inimigo, da miséria, da falta de acesso, da falta de educação, da FALTA, é o pior inimigo. É pior do que o câncer. Alcança mais gente, é mais mortal. E, sobretudo, é tão INJUSTO!

Vejam a fotinho do Erik, da Elena, e eu, versão ruiva, depois de uma super-sessão de tratamento com minha amiga e excelente cabelereira Danielle, que veio em casa cuidar de mim. Eles estão bem, eu estou bem. Só falta respirar fundo e seguir em frente. ;-)

Ainda não temos resposta da tipagem da Elena, para saber da sua compatibilidade com o Erik. Continuem doando medula óssea, é tão importante... Quem ainda não fez, não dá jeito de arranjar um tempinho na agenda?!

Beijo grande, no coração de todos vocês, e não me levem à mal se não escrevo... tem dias em que a gente se sente, como quem partiu ou morreu, a gente estancou de repente, ou foi o mundo então que cresceu... daí chega a roda viva, e carrega o destino prá lá...

segunda-feira, 15 de julho de 2013

Felicidade em meio a tempestade

Felicidade, mesmo que no meio da tempestade. Calmaria num dia sem eventos. Estou em casa, em cima do sofá, ninando meus filhos. Assisto desenhos na TV. Ouço as gargalhadas do Erik, sou escalada pela Elena que me pede para me maquiar. Ela desenhou algo indefinido na minha bochecha. Disse que é uma borboleta.

Levei meu paizinho no aeroporto, Elena de companhia. Deixei o Erik com a dinda Gilza, em casa. Difícil me despedir do meu pai, do colo dele, das nossas conversas infinitas sobre filosofia, estatística, economia e política. Sempre consertamos o mundo... meu pai me entende. Falei com minha mãe no telefone. Ela também me entende. Planeja vir em agosto. Saudades dela. A Elena falou com ela ao telefone e contou: "Vovó, ontem andei de Pônei, mas ele não voava". Risos, muito bom ouvi-la...

Tomei um banho demorado, enquanto ainda conto com a empregada. Estou à espera do marido que só faz trabalhar, tadinho. Sei do estresse dele, quero dar um pouco de colo, mas nem para isso ele tem tido tempo. Sinto uma certa estranheza: como não estou trabalhando também? Como não estou morrendo de estresse junto com ele, às vésperas de um evento tão grande? Ah é. Eu pedi demissão... ;-) Estou de plantão, à disposição dos filhos, à disposição do Erik, se ele precisar de mim. Assumida posição de mulher, dona de casa, mãe em tempo integral. Não conhecia isso, foi novidade para mim. Digamos que as condições me obrigaram, e, bom, preciso me acostumar e, quem sabe, até gostar. No mínimo, enquanto durar esse plantão prolongado durante o tratamento do Erik. Dois anos, é a previsão. Eu gosto de ser mãe em tempo integral sim, mas... não é estranho? Não sei muito o que fazer nesta pele nova. Na minha pele antiga eu trabalhava muito, o tempo todo, com agenda sem fim.

Meu pai diz que eu devo ter um projeto pessoal para desenvolver neste período, que eu devo voltar a escrever, pois isso pode ser feito em meio à plantões, sem prazos apertados. Pode ser. Pode ser. Sempre ansiei pela oportunidade de simplesmente escrever. Estou pensando nisso. Maturando. Acho que precisaria de vários dias de calmaria para que outras inspirações se instalassem em mim, que não fossem esse diário do tratamento do Erik. Seria preciso que minha vida não girasse em torno apenas do Erik e sua doença. Seria preciso que eu fosse livre, ao menos na minha imaginação... Aliás, é o único lugar onde podemos ser de fato livres. Se é que a imaginação é um lugar. Preciso visitar esse lugar, preciso me treinar para isso.

Amanhã começa a rotina de hospital da semana, 3o. bloco da 2a. fase da 1a. etapa. Erik vai bem, sem intercorrências até o momento, torço para que continue assim. Amanhã veremos seu exame de sangue, que autorizará o reinício da quimioterapia. Terei algumas horas de espera... vou aproveitar para marcar o raio-x, perguntar novamente se a Elena é compatível com o Erik, quem sabe doar eu mesma sangue... se desta vez me aceitarem. Tentei de outra vez, mas não quiseram me aceitar como doadora, disseram que eu estava sob profundo estresse e que minha doação poderia esperar.

Amanhã tenho contas a pagar, se o dinheiro entrar na conta.

Amanhã vou receber minha amiga Danielle, cabelereira, para cortar meu cabelo, pintar e fazer uma escova progressiva, coisa que não faço (PASMEM!) há mais de seis meses. Digamos que eu estou no estado "bichinho da goiaba". Ela prometeu me deixar linda (isso não acredito, que os 40 anos bateram forte, mas acho que dá para melhorar se ao menos eu der corte no cabelo e esconder meus primeiros fios brancos... rsrsrs fazer a sobrancelha também deve ajudar!). Vai ser bom, muito bom, cuidar um pouquinho de mim e me sentir mulher de novo.

Amanhã tenho que ir no supermercado. Amanhã tenho que buscar o relatório médico da biópsia, para fins de reembolso junto ao plano de saúde. Amanhã tenho que buscar os exames do Edson no Barra D'Or. Amanhã tenho que marcar consulta para ele, solicitar a requisição dos seus exames. Quem sabe amanhã também marco os médicos que eu deveria visitar - minha revisão ginecológica, um dermatologista, um vascular... enfim. Coisas que deveria fazer desde a gravidez, mas não tive tempo. Será que dou conta de cuidar de mim além de cuidar do Erik? Não sei. Cuidar de mim me faz me sentir culpada. Se tenho tempo para cuidar de mim, porque não estou trabalhando?! Que condicionamento maluco.

Mas isso tudo é amanhã. Hoje não, hoje só tenho que estar aqui, ser presente para meus filhotes. Vou tentar não me sentir culpada de não estar fazendo milhões de coisas, de deixar o marido me sustentar, de cumprir esse papel que nunca foi meu, mas que Deus me fez assumir integralmente. Ser mãe e mulher em tempo integral. Entender como é importante ninar um filho e dedicar-se à insubstituível tarefa do afeto...

Sim, sim, me sinto feliz. Feliz porque a felicidade é intrínseca, independe do entorno. Está no olhar, não no objeto olhado. E tudo à minha volta está organizado. E não há nada a ser feito, a não ser sentar-me no sofá e ninar meus filhos.

terça-feira, 9 de julho de 2013

Erik na batalha, ao infinito e além!

Dias se passaram sem que eu conseguisse escrever mais. A vida em casa, indo ao hospital, não tem sido muito propícia à escrita. Tenho priorizado dormir mais cedo, pois no dia seguinte, encarar a linha amarela tem sido um tormento com sono. Confesso que fechei os olhos e levei buzinaços quando o trânsito parava. Gente, tenho levado de 2 a 3h para cumprir os 50km que separam a minha casa do INCA! São longos períodos de puro tédio, esperando, esperando nos engarrafamentos... Tempo em que ora rezo, ora ouço notícias no rádio, ora choro, pensando em toda essa desgraceira, daí luto para afastar os pensamentos tristes, ora canto alguma música na MPB FM, daí me encho de esperança, olho para o retrovisor e vejo o Erik dormindo... ou vomitando, como hoje. Pela primeira vez ele vomitou. Fiquei desesperada, graças a Deus ainda estava na Estrada dos Bandeirantes e pude embicar numa mecânica para atendê-lo. Troquei toda a roupa dele, limpei a cadeirinha como deu, com lencinhos umedecidos (a invenção do século), dei água, me recuperei do susto e segui viagem. Ele dormiu o resto do caminho. Quando cheguei no estacionamento no centro e fui tirá-lo da cadeirinha... ele tinha vomitado novamente e eu não tinha nem visto! Vomitou dormindo! Tive que trocar toda a roupa dele DE NOVO, mas fiquei super-tensa, pensando em como fazer esses percursos sozinha, com ele no carro sem assistência no banco de trás. E se ele se engasga, meu Deus?! Pois é. Mas não tem outro jeito...

Algumas notícias desse período: na 6a feira passada tivemos consulta com o Dr. Alexandre Apa. O mais importante: confirmou-se a remissão da medula do Erik, depois do primeiro mês de tratamento. Isso é fundamental, comprova que ele tem uma excelente resposta à quimioterapia e confirma sua classificação de risco como "intermediária". Ele só não é baixo risco por causa da bifenotipia, por sua leucemia atingir tanto as células B como T, o que aumenta a probabilidade de recaídas futuras. Marcamos o segundo bloco de quimioterapia, para esta semana, no mesmo esquema: 4 dias ambulatoriais, 3 dias em casa, o que é um benção. Serão 4 semanas assim, mas o Dr. Apa acredita que ao todo levaremos de 5 a 6 semanas para cumprir os 4 blocos, pois a tendência é a imunidade dele cair demais e termos que adiar. É a média...

Ainda não temos resposta da compatibilidade da medula da Elena com a do irmãozinho. A espera por esta resposta é uma tortura... imagina se fosse uma emergência?! O que me disseram é que eles só tem dois equipamentos para realizar esses testes, e um quebrou. SUS, gente, SUS. É aí que as mazelas começam a aparecer. Adianta fazer força para aumentar o número de doações de medula, se o Hospital não tem como testá-las a tempo?! Como é que eles só tem 2 máquinas?! O INCA é o hospital de referência, caramba, e neste prédio onde fizemos a coleta, é a sede do CEMO, que administra o Banco Nacional de Medula Óssea... Puxa, quantas vidas estão dependendo disso?! PresidentE Dilma, Ministro Alexandre Padilha... parem de fazer demagogia com a importação de médicos sem diploma e EQUIPEM OS HOSPITAIS, pelamordedeus! Precisamos daqueles 20 centavos economizados em cada passagem de ônibus para comprar mais máquinas, novas e modernas, capacitar mais técnicos, biólogos, pesquisadores, cientistas, e correr com esse negócio! Como disse um cartaz, "NÃO SABEM O QUE FAZER COM 0,20? ENFIEM NO SUS!" Caramba! Segundo me explicaram no CEMO, estavam, na semana passada, concluindo as análises de maio, nem tinham chegado nas coletas realizadas em junho, e a Elena colheu sangue dia 05/06. Quem sabe ao final desta semana já teremos alguma resposta?! Será? Ou vamos ter que esperar virar uma emergência para esse resultado sair?!

Bom, fora isso, outra questão: consulta marcada com o médico para 8h de 6a. feira. Saio de casa às 6h15, para o quê tirei o Erik da cama às 5h30 e levantei às 5h. Cheguei um pouquinho adiantada: 7h50. Adivinhem a que horas fui atendida pelo Dr. Apa? Às 11h. Acontece que o "sistema" abre a marcação das consultas para a partir das 8h, quando teoricamente o médico deve chegar ao hospital (não sei informar a hora que ele chegou). Porém, ele primeiro passa nas enfermarias, depois sobe para o ambulatório, onde tinha meia dúzia de pacientes para atender. Agora me expliquem: não dava para fazer melhor, e respeitar um pouco mais a vida das pessoas e PRINCIPALMENTE, a vida do pobre paciente de 1 ano e 10 meses? Para quê dar prioridade para o bebê subir primeiro no elevador, se ele tem que ficar numa sala de espera por mais de 3 horas?! Tenho certeza que dá para o médico informar a recepção o horário que ele de fato estará disponível e agendar somente para esse horário. Questão de organização, vontade política de fazer mais e melhor. E não falo só por mim. Falo pelos outros pacientes que, na sala de espera, me viram fula da vida e disseram "ah, isso é assim mesmo... marcaram às 8h? Pode ter certeza que não vais sair daqui antes das 13h!". Eles vieram de ônibus. Levaram ainda mais tempo expondo seus pequenos filhos doentes à situações de risco e desconforto. Claro que eu posso, como todos os outros, simplesmente me conformar. Mas não me conformo. Acho inadmissível. Uma falta de respeito. Claro que reclamei com o Dr. Apa, mas ele fez graça, dizendo que quando eu estava internada estava de melhor humor, que ele podia me internar de novo... Dr. Apa, não é sua culpa, nem da secretária, recepcionista, enfermeira, administrador. É do sistema. E não falo do sistema software, que esse é facilmente adaptável. Falo do sistema de conformismo com o ruim, o medíocre, o "deixa assim, é assim mesmo, não vai mudar, é SUS, temos que aguentar, ficar na fila, esperar, ser pacientes, morrer numa maca no corredor, sem atendimento, é normal". Um sistema do qual fazem parte o médico, as enfermeiras, as secretárias, a administração do SUS, o Sr. Ministro da Saúde, a Exma. Sra. PresidentE, e também nós, pacientes. Sei que corro o risco, ao reclamar, ao me mostrar inconformada, de ser tratada com má vontade daqui para frente. Mas não acredito nisso. Sei que quem ler este texto, vai entender que TODOS nós, partes do sistema, precisamos nos INCONFORMAR com o ruim e fazer melhor. Não é por esse Brasil que estamos todos lutando nas ruas?

Buenas, voltemos ao Erik. Ele está bem, gente, está feliz da vida de estar em casa, querendo levantar e colocar o pé no chão. Infelizmente, o Dr. Walter Meohas, ortopedista, não o liberou para colocar o pé no chão. Ele está com o osso da tíbia proximal direita ainda rarefeita, e se colocar peso no pé, pode achatar aquela parte do osso "comida" pela leucemia e, com isso, prejudicar o crescimento da perna. Marcou novo raio-X para daqui 1 mês. Estou com muita dó, pois ele já não sente dor e está louco para ficar em pé. Hoje eu o deixei em cima do sofá, vendo TV, enquanto escrevia no Face. Pois em um segundo ele desceu do sofá. Quando vi dei um pulo, desesperada, e acabei colocando a tala nele novamente, com medo, muito medo, que isso se repetisse...

Outra notícia que me abalou hoje é que, saindo da quimio, passei na enfermaria para visitar os amigos. A Larissa tinha postado uma mensagem tristinha no Face e quis saber o que tinha acontecido. Pois é, acontece que ontem perdemos um paciente de 15 anos, estava no leito em frente ao dela. Todo amor do mundo para a mãezinha Márcia, que Nossa Senhora te console, querida, que possas colocar teu coração nas mãos de Deus, que lá em cima está recebendo teu guerreiro Guilherme... Que saibamos e possamos nos conformar com esses desfechos, por mais difíceis que eles sejam para nós, que daqui de baixo só enxergamos a dor, a tristeza... Amém. Sei que houve também um outro óbito na enfermaria da pediatria, mas não sei quem foi. E Larissa... não te deixe impressionar. Cada história é uma história, cada pessoa tem seu tempo. Deus abençoe todos que estão lá internados agora...

Como podem ver, está tudo bem... hehehehehe. Mãe tensa, braba, neurótica, vivendo momentos bipolares de neurose e depressão, sempre inconformada, leoa total. E cheia de amor para dar, pois o Erik tem sido cada vez mais carinhoso. Faz a alegria de todos que se aproximam dele, com suas gracinhas, com tudo que aprende. Dá "Oiêeee" quando entra no elevador, "Tchauuuuu" quando sai, abana, manda beijos, diz "...ado", querendo dizer "obrigado", direitinho, quando a gente atende um pedido dele. Tem aprendido palavras novas todos os dias. É um doce, inteligente, desenvolvido, bem humorado, inocente de tudo.

A Elena anda com ciúmes. Carinhosíssima, mas magoa-se por qualquer repreensão. Fica ofendida, abaixa a cabeça e sai correndo, triste. E eu a pego chorando no quarto, encolhida num cantinho. Agora, enquanto escrevo, ela está fazendo cafuné na minha cabeça... amo tanto, tanto, tanto esses dois. Que Deus não permita que nada de mal lhes aconteça.

Num próximo post vou falar ainda da Síndrome de Li-Fraumeni. Estamos participando de um estudo genético, pois nossa história familiar bate com os padrões desta Síndrome. São14 casos diretos para o Erik, pasmem, considerando-se que vivemos agora com 4 simultâneos, o que é azar demais para uma família só, precisa haver alguma outra explicação... Mas isso é assunto para muito chope, portanto, fica prá próxima...

segunda-feira, 1 de julho de 2013

Liga dos super-heróis: os enfermeiros e suas identidades secretas

Tenho dito para o Erik: "Sabe essas moças de branco, com touquinha, luvas e máscara, filho? Elas fazem parte da liga dos super-heróis. Quando alguma criança grita: 'Socorro, socorro', elas vestem esse disfarce e vem correndo, e são elas que mais salvam as vidas das criancinhas...! Elas usam essa identidade secreta de enfermeiras, mas na verdade, são todas super-heroínas".

Hoje escrevo para falar de um tema que atinge diretamente a saúde do Erik e de todas as crianças na condição dele. Cedo ou tarde, vai atingir cada um de nós...

Trata-se da jornada de trabalho dos enfermeiros. Eles cumprem 40h de trabalho semanal, em turnos de 12h. Acontece que, com salários abaixo da crítica, muitos deles trabalham em dois empregos... e cumprem 60, às vezes 80h de trabalho semanal, dobrando plantões e ficando 24h acordados, quando não 48h e até 72h. Essas são as condições de subemprego na área da saúde, vividas num Brasil do qual todos nos envergonhamos. São condições às quais os brasileiros, cada vez mais, não se sujeitam.

A enfermagem é uma profissão FUNDAMENTAL para o tratamento do câncer. São os enfermeiros, com especialização em oncologia, pós-graduação em quimioterapia e pediatria, que administram os remédios que salvam do câncer pacientes antes condenados à morte. São eles que, muitas vezes ao dia, checam os sinais vitais dos pacientes, identificam reações adversas ao tratamento, percebem a evolução da doença, mantém viva a esperança e confiança dos pacientes no tratamento, nos amparam nos momentos de desespero, fazem curativos, coletam sangue para exames, aplicam injeções, administram medicamentos (alguns desses remédios podem causar danos à saúde de quem os administra, à propósito) em doses e horários corretos, mantém atualizados os prontuários, fazem a manutenção de cateter, e socorrem os pacientes nas situações mais variadas: de uma diarréia na cama a uma crise de vômito, de uma convulsão a uma crise nervosa. Eles contém pacientes e acompanhantes, orientam, ajudam, puxam a orelha, são às vezes os melhores terapeutas que existem e, com certeza, envolvem-se emocionalmente com as pessoas que tratam. Sofrem junto. Comemoram junto. Estabelecem relação pessoal, percebem as dificuldades, intercedem para que sejam solucionadas. Resolvem da briga conjungal (fala sério, Enf. Patrícia!) ao problema técnico da NET (né, Enf. Ana Paula!). Quando não consertam chuveiros (né não, Enf. Izidro?). Eles realmente botam a mão na massa, sem medo de se sujar.

Como não vou me juntar a eles nesta luta de anos, pela jornada de 30h? Pois junto a minha voz à esta causa, mais do que justa: JORNADA DE 30h JÁ, sem redução de salário! E o SUS e os hospitais particulares que se virem para bancar esse custo, ele é NECESSÁRIO para a melhoria da saúde no nosso país!

Gente, é humanamente impossível ficar 24h direto, com o mesmo nível de atenção e paciência. E eles não podem errar, sabem que são vidas em risco postas em suas mãos...

E embora eu acredite mesmo que eles sejam de uma liga ultra-secreta de super-heróis, sei que na vida real também têm filhos para cuidar, pessoas doentes em suas próprias casas para tratar, contas para pagar, maridos e esposas para amar e acalentam ambições de uma vida melhor, como todo mundo. Sei que passam mais tempo com os nossos filhinhos doentes do que com os seus próprios; e sei que chegar em casa exausto, sugado até sua última gota de energia, não é justo. Eles merecem mais. Para que tenham melhores condições de trabalho, de atenção; para que tenham tempo para estudar, se especializarem ainda mais, e, quando no exercício de sua função, estejam em condições plenas para se dedicar a quem confia a vida nas mãos deles.

Vejam esse blog e o vídeo nele postado, que fofo, do filho de uma enfermeira:

http://filhosdaenfermagemsaude.blogspot.com.br/

Taí mais uma bandeira que estou levantando, com toda a convicção.