terça-feira, 24 de setembro de 2013

Tentando ser normal

Estamos em casa, em casa, em casa. Nem acredito. No último final de semana até que tive bastante folga: a babá do Erik me substituiu no hospital de sexta pra sábado, e o Edson foi ficar com ele de sábado para domingo. Pude aproveitar um pouco do final de semana com minha prima, Luciana, que veio me visitar, e curtir um pouquinho da Elena (chorosa, manhosa, carernte). Tomamos vinho, conversamos até dizer chega, dormi na minha cama, tomei água de côco no quiosque, comi japonês e tomei banho no meu banheiro. Grandes luxos. Elena foi ao teatrinho no Shopping Barra World, passeou com a dinda e a mamãe. Comprei duas blusinhas e uns óculos escuros. Chorei no colo da Lulu, desconsoladamente. Ando muito sentimental, tipo copo d'água quase transbordando. Se alguém me olhar com simpatia, se uma música disser um verso mais inspirado, se a notícia do rádio envolver alguma tragédia, choro de ficar inchada, soluço sozinha enquanto dirijo... Foi bom ter companhia e a sensação de que podia chorar, dar uma "desabada".

Durante a internação, sonhei que ia ao dermatolgista mostrar umas manchas que tenho na perna e na barriga, que andam se acentuando nos últimos meses. No sonho, o dermatologista olhava para mim e carimbava um cartão azul, dizendo "Isso é caso de Inca". Ele estava me dando uma matrícula no Inca, o que significa ter um diagnóstico de câncer. Pavor, medo. Na verdade, meu diagnóstico destas manchas tem 20 anos: trata-se de uma esclerodermia de placas, uma doença autoimune. Meu corpo se autoagride. Piora em situações de estresse. Amanhã, 4a feira, vou a um médico ortomolecular, que me pediu mais de 70 exames e promete tratar do equilíbrio do meu corpo, reforçando meu sistema imunológico. Vários indicadores estão alterados nos exames e ando com medo de estar doente. Mas não há de ser nada. Só estresse.

No domingo, quando fui substituir o Edson logo cedo no Inca, em seguida à sua saída, chegou o médico do Erik, Dr. Alexandre Apa, e nos deu alta. Está tudo bem com nosso bebê. Teve um pouco de dificuldade em eliminar as toxinas do MTX e tomou um remédio para ajudar a metabolizar, mas fora isso está bem, muito bem disposto, afetuoso, brincalhão e risonho. No hospital todos o conhecem - ele grita de feliz, quase não se vê o Erik chorando. Difícil era contê-lo no berço, cheio de energia e com o acesso do soro... Nossa próxima ida ao Inca é só 5a feira, para exame de sangue e se Deus quiser, antecipação da consulta com o médico. Daí definiremos o próximo bloco, provavelmente dia 03/10, semana que vem, com mais uma internação, que se Deus quiser, será a última!

Com a alta, pudemos voltar para casa e ainda aproveitar o final de domingo em família. Estava com muita dor de cabeça, de mau humor, com dor nas pernas - meu problema de circulação é crônico, tenho varizes desde a adolescência e já operei 3 vezes, mas agora está mais difícil de tratar pq tem associado o problema das manchas da esclerodermia. Em resumo: velhice. São os 40 anos, a idade começa a pesar. Coitado do Edson, que tem trabalahdo 24h e ainda teve que me aguentar azeda. Só melhorei depois de uma noite de sono inteira, me sentindo no limite das forças.

Nesta 2a e 3a feira, estou cuidando da burocracia da vida. Pagando impostos, organizando documentos, falando com o contador, mandando o notebook para o conserto e tendo que reinstalar todos os bancos e emails na máquina que foi reinstalada com o tal do Windows 8, que teve um bug logo na primeira atualização. Passei tendo que contratar um despachante para resolver problemas com o Detran, providenciando procuração para um contador em Porto Alegre resolver pendências na Receita Federal, marcando médico para mim, buscando exames no laboratório, contratando um transporte escolar para a Elena, indo ao supermercado. Chatices, mas trabalhar e lidar com a rotina, acreditem, me faz um bem danado. Uns diazinhos longe do hospital e já me sinto um pouco mais normal. Viva o dia a dia!

terça-feira, 17 de setembro de 2013

Inca na veia!

Internada com o Erik para nova rodada de quimo. Vamos para a dose 3 de 4, nossa penúltima internação programada. Hoje iniciamos a hiperhidratação e o Antak, remédio para proteger o estômago. Amanhã, 18h, começa a infundir o MTX, um quimioterápico. Paralelamente, durante todos este mês, ele está tomando Mercaptopurina oral, 2 comp por semana. Tipo uma bomba atômica, né não?! Mas está tudo bem, ele está ótimo, 87cm, 14 kg, pura energia e imaginação, falando, cantando e conversando com os amigos internados. Quer correr pelos corredores (e eu atrás, segurando o suporte com o soro!), entra nos quartos e solta: "Oi pessoaaaal!". Ele ainda anda jogando a perninha direita e, de vez em quando, reclama de dor. Fico grilada com isso, mas o médico disse que vamos acompanhar mais a frente com novos exames de imagem, e que a recuperação óssea é lenta e pode ser que ele realmente ainda sinta alguma dor.

Foi difícil sair de casa hoje pela manhã. Difícil deixar a Elena na escola, difícil ficar longe do Edson, maridão... Tive pouquíssimos dias úteis de trabalho e pouquíssimo tempo com a família. Não deu prá colocar a vida em dia. O que me consola é que estamos avançando, sem retardos, a passos largos, para chegarmos a um final vitorioso. Mérito do tratamento adequado e de muita oração vinda de todos os lados, todos os credos, todas as fés. Por tudo isso, obrigada! Mas confesso que, desde maio, quando internamos no Rio's Dor pela primeira vez, já contabilizo 69 dias de internação. Estou cansada, mas ainda não acabou. Ainda temos mais uma maratona pela frente, não dá prá arrefecer!

Quem me trouxe hoje foi o santo dindo Alemão, que ainda aproveitou para fazer uma coisa linda: doou medula óssea, sangue e agora aguarda que o chamem, dentro de um mês para doar plaquetas. Gente, isso é tão, tão importante! Queria muito que todos seguissem esse exemplo.

Na brinquedoteca, hoje o Erik comeu sua primeira bala, dada por um voluntário, o Cláudio, uma simpatia, e seu primeiro pirulito, dado pela pequena Tamara, enfermeira de mão cheia e toda simpatia. Confiram as fotos no Face!

Fiquei muito feliz em descobrir que uma solicitação pequenininha que fiz para o pessoal da administração foi aceita: colocar ganchinhos nos banheiros para podermos pendurar roupa e toalha quando vamos tomar banho. É que não tinha, então precisávamos colocar a toalha e a roupa em cima do vaso sanitário, da pia ou da lata de lixo, 3 lugares muito infectados. Coisa pouca, mas foi um pedido atendido! Sinal que existem ouvidos do lado de lá, que basta falar. O Inca se torna nossa "casa" por meses, precisamos cuidar de onde moramos, não? Outro dia me irritou o cobertor furado, rasgado, puído. Um cobertor que a gente usaria num filme como figurino de mendigo... Não deveria ser dado jamais a um paciente com quem nos preocupamos com a saúde, com a contaminação por bactérias... Um cobertor e um colchão rasgados, humilhante, não? Descobri que ninguém - nem enfermagem, nem médicos, nem camareiras - se sente responsável por mandar trocar algo que deveria ir para o lixo. É como se caísse no vazio a reclamação. Disseram que a gente deveria reclamar na ouvidoria. Quem deu uma solução foi a simples camareira. Pegou o cobertor e terminou de rasgá-lo... piscou o olho e disse: "Agora não volta mais da lavanderia, pois se estiver só furado e puído, eles lavam e mandam de volta!". Perguntei: mas de quem é a responsabilidade de dizer que uma coisa não presta mais, deve ir para o lixo e ser substituída?!". Parece não haver ninguém. Cabe a nós, pacientes e familiares, reclamarmos, vermos o que está errado.

Sobre o colchão, falei com a pessoa da administração que esteve no quarto por outra razão (a mesma que deve ter providenciado os ganchinhos de parede), ao que ela me respondeu: "Vocês precisam reclamar, temos colchões novos no estoque, quando passamos nos quartos as camas estão feitas e não vemos isso..." . Falei ainda da insegurança dos berços... meu bebê corre o risco de queda, usa uma pulserinha amarela. Mas quando se levanta no berço, a grade bate na cintura dele, ele facilmente emborcaria levando os acessos ao soro com ele, um acidente horrível. Com isso não posso me afastar do berço nem um segundo! É um tipo de berço que jamais passaria naqueles testes do InMetro, sabem? Ela viu, se espantou, voltou mais tarde com alguém da manutenção para tentar estudar uma solução. Pelo visto ainda não chegaram a uma conclusão, mas fui bem atendida.

O grupo "Mães do Inca", no Facebook, aberto a familiares, pacientes e amigos, está crescendo exponencialmente. Creio que temos ali um espaço para nos apoiarmos, o que é fundamental! Bom, quem me conhece do passado deve estar lembrando dos meus tempos de Grêmio Estudantil e Centro Acadêmico. E depois como jornalista, lógico. Claro que isso me deu uma certa experiência em não me conformar com o que vejo de errado, em lidar com instituições e com o poder público, em conhecer os direitos do cidadão... Não seria agora que eu iria ficar calada, na situação mais crítica da minha vida e com a saúde e bem estar do meu filho em jogo! Espero que todas essas mães percebam isso - que têm voz, que podem e devem exigir mais da saúde pública, da instituição, do governo, dos profissionais que nela trabalham.

A lista de problemas é grande! Listo alguns, dos mais diversos, estruturais, de infraestrutura e algumas perfumarias que tornariam o processo todo menos doloroso:

Falta roupa de cama, colchões, travesseiros; falta a limpeza do ar condicionado ser regular, há dois anos não é feita e muitos pacientes estão sofrendo de sinusite crônica, sendo obrigados a cirurgias dolorosas (poderia ter sido essa semana, estamos com vários leitos vazios!), faltam berços mais seguros; faltam camas decentes para os acompanhantes; faltam fraldas de tamanho M, G e XG, pois eles só dispõem de uma fralda horrorosa, que dá assadura, e só nos tamanhos P e adulto; falta a abertura de novos concursos para enfermeiros e médicos especialistas; a jornada de 30h para a enfermagem; salários atraentes para médicos especialistas; terapeutas ocupacionais que garantam a abertura da brinquedoteca em horário comercial (hj abre das 10h às 12h, o resto do tempo fica fechada); um espaço para os adolescentes (que tal uma lan house?); assistência psicológica efetiva para os familiares e acompanhantes de pacientes com câncer; direitos de aposentadoria para quem acompanha um paciente com câncer, ainda que provisória, independente da renda familiar; falta um espaço de convivência para os pacientes e familiares internados (uma sala de estar, p. ex.); cursos profissionalizantes para quem precisa retomar a vida e manter uma renda enquanto acompanha um paciente; e certamente faltam equipamentos e técnicos que garantam mais agilidade nos exames de alta complexidade; faltam suportes para soro com rodízios que funcionem; faltam vagas (4 pacientes por quarto com 4 acompanhantes é quase insalubre); falta uma decoraçãozinha mais alegre (o Erik ama os quadros de peixe da ala da pediatria, já contei); falta uma limpeza mais acurada nos quartos e banheiros (limo e mofo não são aceitáveis num hospital!), etc,
etc.

Vou fazer elogios, também: o atendimento é imediato, os enfermeiros são dedicadíssimos, os médicos atentos. Uma equipe de parabéns, fazendo mais do que podem. Uma gente que merecia ser reconhecida e motivada, aplaudida de pé. Gente que abraça uma das profissões mais difíceis do mundo e que precisea ser valorizada.

A ordem dos nossos novos tempos é: não se conforme com pouco. Vocês, todos nós, merecemos mais.

terça-feira, 10 de setembro de 2013

Um "Sim" no meio da tempestade.

Saudades do meu amor, Edson Erdmann. Eu cá, em terras fluminenses, cuidando das crianças, função Erik-doente-Elena-carente, e ele lá, cuidando do trabalho em Porto Alegre, no momento, meu reino tão tão distante. Alguém tem que sustentar a vida, eu sei. Queria ele comigo o tempo todo, dividindo cada momentinho do Erik, dando suporte para a Elena enquanto eu tenho que estar internada... Mas e quem cuida "do lojinha"? Para que eu possa me afastar do trabalho, ele tem que ser full time na produtora... e com projetos fora da base Rio, não tem jeito... a gente acaba se encontrando pouco. Isso é triste, dói no fundo da alma, vai dando aquela sensação de solidão... uma saudade chata, meio revoltada...

Quero misturar mais. Dividir mais, nem tão lá nem tá cá. Nem sempre é possível, tem horas que a gente tem que se dividir para depois poder somar, e isso também é parceria, casamento... um cuida do leme, outro rema desesperado, um tira a água do convés, enquanto outro estuda o mapa... Enjoada de tanto mar, tanto sal, quero ver a margem do outro lado... terra firme onde a gente se encontre e possa lamber nossas feridas.

Sei que muita gente passa por isso na situação de um filho doente... ter que administrar os outros filhos, a casa, o casamento e ainda manter as finanças em dia... Hoje paguei contas que venciam dia 05, todas atrasadas. Claro, era para eu estar de volta até o dia 05, mas acabei prorrogando a internação do Erik por causa da dosagem do MTX, como expliquei no post passado. Foram 7 dias internada, quando a previsão inicial eram 3 dias...

Acaba que todo mundo sofre. Eu, ele, as crianças. Felizmente, contamos um com o outro, é uma parceria sólida, honesta, disponível, sei que é prá vida toda, pro que der e vier. Sabemos das escolhas que fizemos, das dificuldades que teríamos que enfrentar. Sabíamos que teríamos que encarar eventuais distâncias. Mas que droga, tem horas que é tão difícil! Tão difícil ser consciente e maduro o tempo todo...

Ando com tanta peninha da Elena, minha filhota, princesa, boneca... ela está super-hiper-carente. Ao me ver ontem, primeiro euforia, em seguida choradeira. Toda tristonha, problemas na escola... Neste final de semana que passou, o Edson teve que ir para Porto Alegre, e eu tive que ficar internada. Felizmente, minha mãe e minha irmã, Bia (ainda de luto, tudo tão recente...), estavam no Rio. Fiquei triste por não ter podido estar com elas, mas por outro lado, grata por elas estarem com a Elena, caso contrário, como seria?! Ela ficaria entre a babá, o dindo Alemão, a dinda Gilza... que são maravilhosos, gente com quem eu conto feliz, carinhosos e disponíveis, mas... que não substitui o colinho de mamãe, né? Ela foi para a praia com a Bia no domingo, passaram a tarde juntas e adivinhem só... pediu para chamar ela de mãe! Fiquei prá morrer. Não por ciúmes, me entendam, mas por dó, de perceber o quanto ela sente minha falta, falta do carinho de mãe... Que que eu posso fazer? Como fazer mais do que eu estou fazendo? Queria me rasgar em duas, para atender os dois. Não, em três, para também poder estar com o meu maridinho... não, em quatro, para também poder dividir com ele o trabalho, adoro trabalhar! Sou mais feliz e bem humorada trabalhando! Na verdade, queria ser cinco, pois uma cuidaria de si mesma: iria aos próprios médicos, caminharia na praia, tomaria um chope no final da tarde com os amigos, faria academia, yoga, cuidaria da horta, gerenciaria a reforma da casa que parou, leria mais, que me faz muita falta um bom livro, iria ao cinema, faria um novo curso de roteiro - não, talvez um de poesia com o Ferreira Gullar na Casa do Saber, o que eu ia adorar, tipo assim madame no meio da tarde, iria à praia para ficar estendida na areia "quarando", cheia de preguiça até para ler jornal e claro, dormiria uma tarde inteira, sem se preocupar com NENHUM compromisso. Ah, desculpa amiga Danielle, iria ao salão, que minhas sobrancelhas já viraram taturanas, e não faço as unhas há mais de seis meses...! Um shopping-cinema-restaurante também vinha bem. Mas essa vida ficou prá trás... E lamentá-la é perder tempo... tempo de ser feliz com o que tenho, com o que posso. Pois "a vida é cheia de possibilidades", já diria o anão do Game of Thrones, mesmo depois de dilacerado, perseguido, acusado, enganado, rejeitado, afogado e ressuscitado.

Conheci muitas amigas maravilhosas que tinham irmãs/irmãos especiais. Essa é uma parte da história - a de ser irmão - que é muito complicada, mas que também transforma a criança para sempre, a torna diferente. Em geral, a torna melhor. Foi o que aconteceu com essas amigas admiráveis de que eu me lembro e que sempre me marcaram muito. A doença do Erik está nos tocando e transformando a todos, e certamente está tocando a Elena muito profundamente, transformando a vidinha dela de princesa, obrigando a amadurecer. É a história dela também.

Que tudo isso só nos fortaleça e nos faça melhores. Tenho certeza que fará. E, Edson, amor da minha vida para todo o sempre, minha resposta é "SIM!". Mas quero tempo para poder escolher um vestido de noiva bem bonito, tá? E preciso emagrecer para caber nele. E tá difícil não comer chocolate quando estou internada... E antes que penses diferente: EU TE AMO e sim, tu existes, graças à Deus. Se não, o que seria de mim?

sábado, 7 de setembro de 2013

Sabadão no INCA - Um 7 de Setembro diferente

Há dias não escrevo no blog, mas acredito que a turma esteja atualizada pelos posts do Face... Foram dias de muita atividade.

Em primeiro lugar, para tranquiliza-los: o Erik está bem, dentro do previsto, dentro do quadro! Estamos agora no INCA, internados ainda, em função do segundo bloco de MTX´(serão 4 blocos ao todo), da fase de intensificação. MTX é uma quimioterapia que fica pingando no sangue do paciente por 24h. Ou seja, estamos cumprindo o tratamento direitinho, sem grandes desvios. Infelizmente, era para eu sair hoje, mas o exame de sangue dele ainda apresenta traços da quimio e eles tem por critério esperar ficar abaixo de 0,4 para liberá-lo. Está 0,52, próximo do ideal, mas ainda não ideal. O saco é que amanhã é domingo, vão colher o exame novamente mas não sei se já terei liberação do exame a tempo de me darem alta... É possível que só saíamos na 2a. Ou seja, o que idealmente era 3-4 dias de internação, já são 5, e se tornarão 6 ou 7. Snif.

Na primeira internação de MTX, o Erik chegou aqui com uma conjuntivite viral, lembram? Depois ele teve febre alta, sintomas de uma bacteremia e bastante diarreia, daí descobrimos que estava com uma bactéria boba, chamada Clostridium Dificili. Foi um susto, febrão e calafrios... Tomou antibiótico bonitinho e ficou tudo bem. Desta vez não tivemos nenhuma intercorrência.

Essa semana foi o aniversário do Erik. Minha mãe e minha irmã Bia vieram de Porto Alegre passar uns dias no Rio, o vovô Edgar também apareceu e comemoramos em casa, bem intimamente, na última 2a. feira. Na 3a. viemos para o hospital para a internação. Não tinha vaga... e nosso médico aqui, Dr. Alexandre Apa, estava possesso, pois a vaga reservada para o Erik na hematologia estava ocupada por um paciente da Pediatria. Ele deu o jeito dele, fizeram várias mudanças de leito e a vaga do Erik acabou saindo. Esse assunto merece um parênteses. Coisas políticas de hospital... Acontece que a hematologia pediátrica - onde são tratados os pacientes com leucemia e outras doenças do sangue - está subordinada ao setor de hematologia geral do hospital, que atende tanto crianças quanto adultos. Atualmente temos uma área só para crianças, mas os médicos atendem os dois setores... Não são pediatras, portanto, mas especializados em hematologia apenas. Já a oncologia pediátrica é um departamento específico, com uma chefia única. Os dois setores andam meio de birra um com o outro... Na hematologia pediátrica, temos 12 leitos, e na pediatria são 18. Na pediatria sempre faltam leitos, os casos são muito frequentemente mais graves e cascudos do que os da hematologia, e um setor invade o outro com frequência. Porém, os cânceres do sangue são graves, importantes, frequentes, e merecem cuidados especiais. Buenas, para resumir, ando pensando no que seria o mundo ideal... Puxa, são 50 mil casos de câncer hematológico diagnosticados por ano no Brasil. Não era de termos um hospital especializado nisso?! Uma ala com médicos hematologistas pediátricos?! Caramba. Esse é o hospital de referência do Governo Federal. Tem taaaanta coisa a ser feita. Tanta.

Enquanto esperávamos esse lance da vaga se definir, montamos na brinquedoteca a festinha de aniversário do Erik, com a presença da Galinha Pintadinha... Isso foi muiiiiito legal, mas teve um episódio tragicômico. A Galinha, com seu visor no bico, não viu o pobre do Erik correndo para abraça-lo. Ele levou um chute homérico e passou boa parte da festa chorando com medo dela, muito magoado. Dava pena de ver... rsrsrsrsrsrs tadinho do meu filho! Mas super-valeu. No final ele adorou. E as outras crianças curtiram bastante também, e deu para a Galinha ainda visitar os quartos e a CTI, para levar um pouquinho de alegria para os pacientes que não puderam sair dos seus leitos.

Neste meio tempo, desde a útima internação, vocês sabem que fui chamada por duas mães para conhecer uma moça que tinha recém sido internada com o filho. Imaginem só a situação. Ela estava grávida, de 7 meses, quando descobriu a doença do filho. Mora em Campos de Guaitacazes, com o marido, que já tinha um casamento anterior com 5 filhos. Ou seja, ele está partindo para o 7o. filho. É caixa numa loja. Ela está sozinha no Rio, pois para ele vir de lá, só perdendo o emprego, e daí eles vão viver do quê? Bom, a idéia das mães era organizarmos um chá de bebê para essa mãe, pois ela não tinha ainda enxoval para o bebê que iria nascer... E eu tinha tido uma vizinha de leito que também estava grávida, com o filho em uma rescidiva. Já tinha falado dela aqui, foi uma pessoa que me fez dar algumas risadas durante a nossa primeira internação. Cláudia, uma palhaça. Também grávida de 7 meses. Resolvi apelar para o Facebook e pedir doação de coisas para montar um chá de bebês para as duas. Vejam pelas fotos o resultado! A coisa foi crescendo, tive amigas novas que encamparam a causa, como a Bia La Greca, a Renata Real e os velhos parceiros para todas as guerras, como o Alemão, padrinho do Erik. Todos se mobilizaram, multiplicaram, e o milagre se fez. Juntamos coisas suficientes para 6 enxovais, e descobrimos outras mães necessitadas. Posto as fotos para ficarem registradas aqui.

Mas preciso contar como isso rolou, pois foi confuso prá caramba no dia! Marquei o tal do chá de bebês para ser feito na brinquedoteca. Daí descobri que no mesmo dia estava agendada uma festa de aniversário do Fábio Henrique, amiguinho do Erik e filho da minha já amigona Thauana, colega de várias internações. Combinamos nós duas de fazermos primeiro a festinha dele, às 15h, e depois o chá de bebê, aproveitando a mesma decoração. Tínhamos coisas que sobraram da festa do Erik e também coisas de decoração doadas pela amiga Danielle, da Festa das Comadres. Depois de alguma negociação entre vários setores (professora das crianças, enfermeira chefe, nutrição, mães), estava tudo combinado, na 4a, para que isso rolasse na 5a.

Na noite de quarta, um dos nossos colegas de quarto, começou a passar mal... e teve 3 convulsões ao longo da noite. Acabou indo para o CTI pelas 4h da manhã, depois de, durante uma convulsão, arrancar o acesso e provocar uma sangueira na sua cama. Ficamos todas muito envolvidas com a situação dele, e portanto, não dormimos... Muito estressante, muito triste, muito preocupante. Talvez tenha sido resultado da quimioterapia, ou da própria doença, mas o fato é que ele teve uma isquemia... Dureza. Estava acompanhado de uma prima, pois a mãe dele é uma pessoa muito nervosa. A família resolveu não informa-la durante esses episódios, pois de nada adiantaria (são do interior) fazê-la vir para, estando aqui, não conseguir lidar com a situação com tranquilidade. Decisão difícil, pensei na hora...

Pois então. No dia seguinte pela manhã fiquei recebendo várias doações que chegaram tardiamente - gente que morava mais perto do centro e preferiu vir entregar tudo aqui. Foram umas 3 pessoas em sequência. Aí veio o chefe geral da enfermagem... e me disse que na verdade não poderíamos fazer o que estávamos fazendo, que ele entendia a intenção e faria de tudo para encontrarmos uma solução, mas que a coisa tinha deixado de ser algo pequeno para se tornar um evento e que acabou chegando aos ouvidos dele... e que no hospital eles tinham uma série de regras que ele é obrigado a seguir. Todas as doações precisam ser protocoladas no INCA Voluntário, que é o setor responsável por isso, e que cadastra as pessoas que precisam e distribuem conforme acham mais adequado; que eles não podem autorizar eventos para distribuição de coisas nas dependências do INCA, pois isso vira uma tremenda bagunça e que ele então precisaria informar o pessoal do INCA Voluntário para encontrar uma solução. Em cerca de meia hora, chegou o Alemão com o carro lotado de coisas. Enquanto ele entrava no quarto, acompanhado da Bia La Greca, no mesmo momento em que uma das doadoras estava no quarto (pensem que é uma enfermaria com 4 leitos ocupados por pacientes e seus acompanhantes) cheia de sacolas, chegou o pessoal do INCA Voluntário, com o assessor de imprensa deles e mais o pessoal da enfermagem... neste exato momento, chegou a mãe do menino que tinha passado mal e viu o leito dele vazio. Ela teve um ataque, gritou muito e, na sequencia, desmaiou, tendo que ser atendida pela enfermagem, pela prima que cuidava do filho e também pela psicóloga que já estava de plantão, além do médico. Vocês conseguiram imaginar a cena? Confesso que eu tremia dos pés à cabeça nesta hora, foi muito punk!

Bom, a mãezinha essa foi atendida na sala de curativos, foi medicada, voltou a si, visitou o filho na enfermagem e acabou voltando com o seus familiares para casa - ela realmente não teria conseguido manejar a situação da noite anterior e a prima dela estava certa, era preferível que ela ficasse casa...

Quanto ao chá de bebê, foi lindo demais. O INCA Voluntário deu um jeito, claro - nos cedeu o saguão do auditório, no 8o andar. Como Deus provê tudo, filamos até o lanche - estava tendo um curso no auditório e o coffe break foi cedido para nós... rsrsrsrsrs... Mas ficou combinado que, das próximas, agiremos em conjunto. E já tenho outras missões - agora estou empenhada em ajudá-los a fechar o elenco da festa-show do dia das crianças, a ser realizada dia 08/10, das 12h às 16h. Precisamos de 2 números musicais que façam a festa da garotada... e doações de brinquedos novos para compor os presentes deles! A festa é para 300 pacientes e seus acompanhantes.

No Chá de Bebê, quatro das seis mães cadastradas compareceram (só uma estava com o filho internado), e eram pessoas que precisavam mesmo muito de ajuda. Vale dizer que a grávida que está com o filho internado também está internada na maternidade, pois teve pré-eclâmpsia. Foi substituída pelo marido, que está aqui cuidando do filho... Conseguiu férias de 15 dias na loja em que trabalha em Campos e veio... Como será depois, só Deus sabe...

Muitas das coisas doadas foram lindas, compuseram enxovais completíssimos e kits de fraldas muito bons. Elas - e ele - saíram daqui emocionadas e felizes. Pensei muito no que dizer na hora da distribuição e compartilho isso com vocês: aqui, nos tornamos irmãs, irmanadas pela mesma dor, pelas mesmas preocupações. Mas a vida é feita de dor e alegria, e junto da doença, novas vidas se formam, e precisamos celebrar a vida quando ela vem. Apesar de tudo que estamos passando, elas estão grávidas, gerando novas vidas para esse mundo maluco, e isso tem que ser comemorado, tem que ser um momento de alegria e felicidade. E o que fazem as irmãs quando uma engravida? Montam chás de fraldas. Dão mimos. Fazem vontades, mesmo as mais extravagantes. E isso é saúde, também, é a saúde da família, e promover saúde é nosso papel, protege nossos doentes.

Algumas pessoas estão insistindo em me elogiar. Não, não, não. Eu não sou especial. Quero dizer que a Luciana, a Rosana, a Thauana, a Rosângela, a Cielle, a Suzana, a Carla... todas estas, e muitas outras, foram responsáveis por este momento do chá de bebê, pelas festas de aniversário dos nossos filhos e por dar o pontapé inicial nesta corrente do bem que se formou. Elas foram incríveis, e o são em todos os momentos aqui, socorrendo umas às outras. Somos todas filhas de Maria, e é a necessidade que nos torna especiais. Nossa cruz, nossa missão, nossa benção. Isso nos torna irmãs, manas. Que elas saibam que podem contar comigo, e se eu tiver qualquer canal - qualquer um - que eu possa usar para ajuda-las, eu vou usar.

Esse não é um 7 de Setembro comum para mim. Não tem desfile, ouço bombas de protesto e sirenes de polícia somente à distância, mas estamos aqui cumprindo nosso papel de soldadas da família brasileira, cuidando de quem precisa de cuidado. Sigamos em marcha, portanto, cada um no seu posto. Seja qual for o seu posto (você sabe qual é?), cumpra o seu dever, cidadão...